"Sem fé, ouso pensar a vida como uma errância absurda a caminho da morte, certa.
Não me coube em herança qualquer deus, nem ponto fixo sobre a terra de onde algum pudesse ver-me.
Tão pouco me legaram o disfarçado furor do céptico, a astúcia do racionalista ou a ardente candura do ateu.
Não ouso por isso acusar os que só acreditam naquilo de que duvido, nem os que fazem o culto da própria dúvida, como se não estivesse, também esta, rodeada de trevas.
Seria eu, também, o acusado, pois de uma coisa estou certo: o ser humano tem uma necessidade de consolo impossível de satisfazer. Como posso, assim, viver a felicidade?
Procuro o que me pode consolar como o caçador persegue a caça, atirando sem hesitar sempre que algo se mexe na floresta.
Quase sempre atinjo o vazio, mas, de tempos a tempos, não deixa de me tombar aos pés uma presa.
Célere, corro a apoderar-me dela, pois sei quão fugaz é o consolo, sopro dum vento que mal sobe pela árvore.
Debruço-me.
Tenho-a! Mas tenho o quê, entre estes dedos?
Se sou solitário - uma mulher amada, um desditoso companheiro de viagem.
Se sou poeta ou prisioneiro - um arco de palavras que com assombro reteso, uma súbita suspeita de liberdade.
Se sou ameaçado pela morte ou pelo mar - um animal vivo e quente, coração que pulsa sarcástico; um recife de granito bem sólido.
Sendo tudo isso, é sempre escasso o que tenho!"
Stig DaGerman
2 making sense:
Adoro o Stig Dagerman. Pelos livros que escreveu e que me fascinaram, nomeadamente, “A Nossa Necessidade de Consolo é Impossível de Satisfazer”, e pela morte que ele chamou aos 31 anos. Era ainda tão novo e tinha tanto para dar. Nem sei o que lhe passou pela cabeça.
Concordo contigo, talento perdido demasiado cedo!
Beijinhos
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